PADRE DOUGLAS: “Sede praticantes da Palavra, e não meros ouvintes, enganando-vos a vós mesmos!” (Tg 1,22)

Ao celebrarmos, neste último domingo do mês de agosto, a vocação daqueles irmãos e irmãs que assumem o ministério de catequistas, a liturgia do 22º domingo do tempo comum nos oferece 3 exemplos claros, de catequese e de catequistas.

Vimos o exemplo de Moisés, na 1ª leitura (Dt 4,1-2.6-8), o exemplo de São Tiago, na 2ª (Tg 1,17-18.21b-22.27) e  o exemplo maior de todos: o próprio Senhor Jesus, no evangelho (Mc 7,1-8.14-15.21-23). Neste domingo, todos nós precisamos, no primeiro momento, elevar a nossa ação de graças a Deus, porque se hoje nós estamos aqui, foi graças a um catequista.

Nós hoje só estamos aqui, celebrando e professando a nossa fé, porque alguém, no passado, nos introduziu nessa mesma fé. Na verdade, hoje nós nos lembramos de que catequese não é outra coisa, senão o anúncio da Palavra, instruir na fé, anunciar, fazer ecoar essa Palavra na nossa vida e na vida dos outros. É como se nós estivéssemos fazendo expandir a Palavra que nós acolhemos, de tal modo, que alcance os outros. Por isso é preciso que nós hoje, também nos lembremos: a missão de catequistas, é claro que, em sentido estrito, é a missão de algumas pessoas na comunidade. Mas em sentido amplo, todos nós somos catequistas, porque todos nós somos chamados a viver e a anunciar essa Palavra.

Na primeira leitura, Moisés lhes ensinava algo que não pode passar despercebido por nós. O catequista é aquele que recebe a Palavra, que não é sua, e anuncia, integralmente, essa Palavra que recebeu. É interessante, que Deus ordena que Moisés não acrescente nada e nem tire nada, lembrando, que nós também não temos que negociar a Palavra, ao anunciá-la aos outros.

Não podemos também transmitir essa Palavra como se estivéssemos transmitindo a nossa. É claro que será a transmissão do nosso jeito, mas a Palavra é do Senhor, e por isso é preciso ser fiel a sua Palavra e anunciá-la, integralmente, como o próprio Senhor se dirigia ao seu povo, através de Moisés, na 1ª leitura. E ao mesmo tempo, Deus se revelava como aquele Deus que está próximo, que acompanha, que está ao lado, não um Deus longe. É preciso que nós também, cada vez mais, experimentemos esse Deus que é próximo de nós, que nos acompanha e que nos orienta.

Depois, na segunda leitura, São Tiago nos convidava a uma concretização desse anúncio. Interessante que a primeira coisa que São Tiago nos lembrava é que nós precisamos acolher essa Palavra com humildade. “Recebei, com humildade, a Palavra que em vós foi implantada e que é capaz de salvar as vossas almas”. Essa humildade, que nos faz reconhecer necessitados dessa Palavra. Humildade essa, que nos faz reconhecer dependentes do Senhor e da Sua graça. Mas ao mesmo tempo, São Tiago nos alertava para um perigo: “Sede praticantes da Palavra e não meros ouvintes.” Uma tentação é nos contentarmos em ouvir a Palavra. Mas hoje, estamos ouvindo essa Palavra mas essa Palavra precisa ser colocada em prática, precisa ser atualizada na nossa vida, não basta escutá-la, porque qualquer um pode escutá-la, qualquer um pode entrar agora na igreja para escutar a Palavra, mas eu e você somos chamados a concretizá-la, a atualizá-la no hoje da nossa vida.

E ao mesmo tempo, fazendo com que essa Palavra gere uma nova forma de viver a nossa fé. Tiago lembrava que é preciso concretizá-la no cuidado, no amor, na caridade! Não é possível, nos lembrava São João (1Jo 4,20), dizermos que amamos a Deus se não amamos o próximo. Não há religião, não há religação entre nós e Deus que não passe pelos outros! Cada irmão, cada irmã é manifestação clara do próprio Deus na nossa vida.

Que fé é essa, que não toca o outro… que fé é essa, que temos, dizendo que amamos a Deus, que servimos a Deus e não enxergamos o outro, e não cuidamos do outro? São Tiago nos alertava, de que essa religião pode ser falsa, se assim a vivermos.

E no ponto alto dessa liturgia, o próprio Senhor, no evangelho, nos dirigia uma palavra, ao mesmo tempo em que advertia os mestres da lei e fariseus. O que o Senhor, no fundo, nos ensina hoje, neste evangelho? uma outra tentação que nos ronda. A tentação de vivermos uma fé aparente, uma fé de capa! Nós, de certa maneira, somos tentados a viver assim, somos tentados a viver a nossa fé nos segurando em práticas, em costumes, e achamos que já está bom demais. Mas aí nos esquecemos de que o que precisa ser transformado, o que precisa ser mudado, é o nosso interior. De tal maneira, que ao mudar o coração, ao mudar a mente, o nosso exterior não poderá refletir outra coisa, senão uma vida convertida, uma vida transformada pela graça e pela Palavra de Deus.

O problema é que nós, talvez até porque somos do Rio de Janeiro, porque somos brasileiros, nós gostamos de uma fantasia, nós gostamos de nos transvestir de um cristão piedoso. Mas dentro de nós, às vezes o que existe é um pagão, às vezes o que existe é um homem ou uma mulher que não vive, verdadeiramente, a sua fé. É preciso que nós superemos essa tentação, como o Senhor nos alertava, por isso nos lembrava do profeta Isaías, quando dizia: “este povo me honra com os lábios, mas o seu coração está longe de mim”. É um povo que honra o Senhor da boca pra fora, entoa louvores, canta, dança, faz suas preces, mas no fundo, no mais íntimo, não vive a sua fé!

Esse perigo todos nós corremos, e é preciso que estejamos atentos, para não nos tornarmos cristãos, na escola dos mestres da lei e dos fariseus, que viviam, também, uma religião aparente. Por isso, Jesus nos lembra, no evangelho, que o que nos faz impuros,  o que nos faz pecadores, não é o que vem de fora, porque o que vem de fora a gente pode acolher ou não acolher! O que vem de fora, como o próprio Senhor nos lembrava, sobretudo se referindo aos alimentos, entra e sai, mas o que faz de nós, verdadeiramente, homens e mulheres impuros, é o que sai de dentro de nós, é o que nós doamos aos outros, é o que nós vivemos, o que nós colocamos pra fora.

Assim, o Senhor nos lembrava, fazendo como que um exame de consciência conosco! O que sai do seu interior, de dentro do coração humano, o que sai são as más intenções, as imoralidades, roubos, assassínios, adultérios, ambições desmedidas, maldades, fraudes, devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de juízo… Todas estas coisas saem de dentro e são elas que tornam impuro um homem. É preciso que hoje, olhemos, atentamente, pra dentro de nós, e nos perguntemos: o que nós estamos botando pra fora, o que nós estamos fazendo transbordar da nossa vida? e não queiramos nos fantasiar, porque no fundo, o Senhor sabe o que está dentro de nós.

Que ao concluirmos este mês, dando graças a Deus porque nós fomos iniciados na fé, que peçamos também a Ele, a graça de sermos anunciadores dessa mesma fé. Que não sejamos um povo que O honra da boca pra fora, que O honra com os lábios, mas o coração está longe dEle, e que não sejamos um povo que, simplesmente, acolhe a Palavra, mas não a coloca em prática.

Que possamos hoje, dar um passo em nossa caminhada de fé e nos tornarmos, de fato, praticantes da Palavra, e não meros ouvintes.

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