Amados irmãs e irmãos! Por que corre um homem? Se esse homem representar todos os homens e toda a espécie, se ele representar a todos, sem exceção, por que todos os homens correm? O que faz o homem correr? Atrás do que ele corre? No sentido literal da expressão, uma perna à frente da outra, o pé direito e a seguir o esquerdo e vice-versa. Será que o homem corre pelo prazer do sofrimento, em si, com todas aquelas centenas de músculos trabalhando em prol do bem-estar físico e psicológico a ser usufruído na posteridade do exercício? A uns é a glória que os move: cada minuto e cada segundo em que cada palmo do terreno é medido dá vitória, dinheiro e fama, ou, ao contrário, desilusão e choro. Para outros, nada mais os motiva do que a perda de algumas medidas excedentes no desejo final de agradar a quem ama. Seja qual for o resultado desse produto dá no mesmo e tem base numa coisa só e nada mais nos move: todos correm para ganhar a vida.
A questão fundamental não é por que os homens correm, mas para que os homens correm e aonde querem chegar?
O povo de Deus correu. Saiu do Egito com pressa. Nem o tempo de carregar a trouxa teve. A ordem era clara: amarrem o cinto, tomem o cajado e saiam o mais rápido que puderem: essa noite não será como as outras. Saíram fugidos. E quando os carros, cavalos e cavaleiros do faraó os perseguiram, não foi a passo lento que atravessaram o Mar Vermelho. Nas profundezas do mar eles afogaram todos os sonhos e todas as ilusões da vida passada. Perderam tudo para ganhar tudo. Essa era a razão da pressa e da Páscoa. Quem quisesse ganhar a própria vida, iria perdê-la (Lc 17,33).
Jesus também andou e correu. Intermináveis idas e vindas a todos os cantos, a todos os desertos, a todas as beiras de lagos, a todas as cidades, a Jerusalém. Correu atrás dos encontrados e correu, sobretudo, atrás dos perdidos. A ele, nenhuma honra. “Por isso Deus o exaltou e lhe deu um Nome que está acima de todo nome” (Fl 2,9). Mais do que ninguém, ele soube que o mistério da vida passava pelo mistério da morte. Antes de todos, ele soube que quem quisesse ganhar a própria vida, iria perdê-la.
Os santos correram. Uns correram para resguardar as crianças, outros correram para socorrer os jovens e os velhos, os pobres e os analfabetos, os que não tinham nada e os que não tinham nem a si mesmos. Uns correram para ganhar a vida, outros correram para perder a própria vida. O novo santo, o Papa João Paulo II também correu. Correu atrás de todos, sem distinção. Quem conseguirá esquecer a última cena, quando ele quis, desafiando todos os próprios limites da natureza, falar ainda uma última palavra, e a voz não lhe saiu? A impressão que se teve, naquele dia, era a de alguém correndo atrás da própria voz. Ele não fez conta da própria vida. Ganhou muito mais do que ela podia lhe oferecer.
Por que você corre, pra que você corre, pra onde você corre? “Quem quiser ganhar a própria vida, vai perdê-la, mas quem não fizer conta da própria vida, vai conservá-la” (Lc 17,33). Atrás do que você corre? Corremos porque sabemos que não sabemos aonde chegar. Por isso corremos. Mas quanto mais corremos a esmo, mais nos deparamos com o triste fato de não sair do lugar, de ter corrido em círculos, como animal atrás da própria cauda. Entre atropelos de problemas, na cidade, o povo passa, aperta o passo, olha a vida e nada vê. Corremos tanto. Tantos correram tanto. A diferença enorme entre nós e eles, pelo menos, dos que falei acima, é que para eles havia direção, e a direção nunca indicava o próprio umbigo. Era sempre para o outro. Essa é a mística pascal: perder para ganhar. Num mundo onde a ordem é “ganhe” – seja como e de quem for – se a contraordem for “perca”, vai parecer loucura. A mesma que os cristãos de Corinto nem queriam ouvir falar. Lá, os judeus pediam sinais e os gregos, sabedoria. Aqui, uns querem milagres, outros, tecnologia. É sempre assim. “Nós, porém, anunciamos Cristo crucificado, escândalo para uns e loucura para outros” (1Cor 1,23). Porém, para todos, poder e sabedoria de Deus.
O Mistério Pascal começa no deserto do Sinai, atravessa o Mar Vermelho, entre areias e águas, marcado pela não permanência da vida. Nada fica. Tudo é muito frágil, veloz e atravessado de medo e angústia. Para atravessar o deserto foi preciso saber a direção da Terra Prometida. Para atravessar a vida é preciso conhecer a direção do Coração de Cristo, onde nosso coração consegue repousar em paz. Essa é a direção da Páscoa. Essa é a sua direção. Vá e não olhe pra trás. Caminhe. Não tenha medo.
A todos, abençoado Tempo Pascal! Para cada irmão que você encontrar, meu irmão, minha irmã, seja a face do Senhor vivo, ressuscitado.