PADRE DOUGLAS – Ó Deus, todo poderoso, a ascensão de Vosso Filho já é nossa vitória.

Ao celebrarmos o mistério da ascensão do Senhor, a liturgia nos convida a dois olhares. Nos convida hoje, não apenas a olhar para o alto, como São Lucas narrava (At 1,1-11) mas a olharmos também para a frente. A liturgia nos convida a olhar para o alto, reconhecendo o que nós acabamos de rezar na oração coleta do dia, quando rezamos “Ó Deus, a ascensão de Vosso Filho já é nossa vitória.” Já é, para cada um de nós, a certeza de que nós temos parte no céu, de que, de fato, o Senhor antecipou aquilo que todos nós experimentamos. Por isso, de fato, Ele nos convida a olhar para o alto, nos convida a superar o olhar preso às coisas da terra (Cl 3).

Muitas vezes, nem nos damos conta, de fato, de que nós, como diz o autor da Carta aos Hebreus (Hb 13,14) não temos morada permanente neste mundo! Somos todos peregrinos, e por isso, precisamos ter o cuidado de não nos apegarmos e de não gastarmos tempo e energia com coisas que passam, presos às coisas desta terra, estamos todos a caminho do céu. Lá é a meta, lá é a morada permanente, lá é o nosso destino.

Por isso, a liturgia nos convida a fazer este caminho, a superar o olhar pra baixo, elevar nosso olhar pro céu e reconhecer que nós fomos feitos para o céu, e é pra lá que caminhamos, de tal maneira que experimentemos aquilo que o Papa Francisco dizia, no Angelus do Domingo da Ascensão, a alegria por saber que temos um lugar no céu, a alegria por saber que já estamos no céu,  porque o Cristo Senhor e a Virgem Maria anteciparam, como diz Paulo, no capítulo XV da 1ª carta aos Coríntios, aquilo que todos nós, um dia, almejamos experimentar.

Mas ao mesmo tempo, a liturgia de hoje nos convida a um olhar para a frente. Temos que ter o cuidado de não ficar parados, olhando pro céu, porque ainda estamos aqui, ninguém chegou lá. Estamos a caminho, por isso a liturgia nos convida a olhar pra frente, quando o Senhor se volta para os apóstolos e para nós, e dá uma ordem: “Ide por todo mundo, a todos pregar o evangelho.” (Mc 16,15)

Pregai o evangelho, anunciai o evangelho, proclamai o evangelho a toda a criatura. A ordem que o Senhor nos dá é de continuarmos a missão que Ele próprio continuou: de sermos proclamadores do Seu evangelho. Não do nosso, não da nossa lógica de vida, não das nossas manias, do nosso jeito, mas do Seu evangelho, da Sua lógica, do Seu jeito.

Talvez nós, como os apóstolos, nos sentiríamos, diante desta palavra, diante desta cena, um pouco inseguros, temerosos… e até nos perguntaríamos, o que será de nós? Como cumpriremos esta palavra? É preciso que hoje nos recordemos, que S Mateus, quando narra a mesma cena, diz que Jesus se volta para os discípulos e lhes garante: “Eis que estarei convosco todos os dias, até o fim dos tempos”. (Mt 28,20)

É a certeza de que o Senhor que sobe aos céus permanece conosco, nos acompanha e nos conduz, como nos diz São Marcos (Mc 16,15-20), “O Senhor os acompanhava e confirmava a Sua palavra.” O que fez com eles, faz também conosco. Mas para que esta missão aconteça, para que possamos olhar para a frente e seguir em frente, nós precisamos, então, cumprir, obedecer, uma ordem que o Senhor nos deu.

  1. Lucas (At 1,1-11) afirma que Jesus ordena aos apóstolos: “Não vos afasteis de Jerusalém.” Por quê? Porque Jerusalém seria o lugar do cumprimento da promessa: “Recebereis o Espírito Santo e sereis batizados no Espírito Santo.” Pra quê? “Pra serdes minhas testemunhas em Jerusalém, na Judeia, na Samaria e até os confins da terra.”

Sem dúvida alguma, a primeira coisa de que precisamos lembrar é que nós não nos enviamos a nós mesmos, somos todos enviados. E a segunda coisa é que nós só poderemos cumprir esta ordem, este mandato, na força do Espírito Santo. Se não for por Ele, nós vamos sucumbir, se não for por Ele, nós vamos anunciar o nosso evangelho, e não o do Senhor.

Mas vale ressaltar que a ordem do Senhor, de certa maneira nos questiona. Nós esperaríamos, pelo menos no último momento, que o Senhor desse uma lição de moral. Na verdade, passamos 40 dias, o Senhor se encontrou com seus apóstolos diversas vezes, e quando o Senhor deu uma boa lição aos apóstolos? Não encontramos. Talvez até nos frustremos…

Não vimos o Senhor advertindo Pedro, não vimos o Senhor advertindo os outros apóstolos, que também o negaram, também O deixaram sozinho com S João, Sua mãe e algumas mulheres no alto do Calvário. Não há lição de moral de Jesus aos apóstolos, e mais ainda, tem algo que talvez passe despercebido, mas deveria ser lembrado por nós: o Senhor ordena-lhes que permaneçam em Jerusalém, unidos.

Jerusalém é a imagem da Igreja! É permanecer com a Igreja, na Igreja, e em oração. É permanecer com aqueles que, talvez nós não gostaríamos de estar. S João teria todo o direito de falar: com este povo eu não fico, eu até vou esperar o Espírito Santo, mas com Pedro, com os outros apóstolos que negaram o Senhor, que não foram até o Calvário? Com eles não! E é exatamente o contrário, o que vemos: os apóstolos, perseverando, unânimes, em oração, com a Mãe de Jesus (At 1,14). Pra nos ensinar que nós fazemos parte da Igreja, nós somos Igreja, com membros que, talvez, como nós, também ofendam o Senhor, também negaram o Senhor, negam o Senhor!

Vamos lembrar que a Igreja é feita por mim e por você. Que a Igreja, da qual fazemos parte, não é comunhão só dos santos, dos imaculados, canonizados. É feita por homens e mulheres pecadores como nós, como os apóstolos. E é nessa Igreja, que o Senhor cumpre a Sua promessa, enviando o Seu Espírito.

Que a Virgem Maria, nossa Mãe, a quem recorremos ao longo deste mês, nos ajude a fazer esse caminho. Que como ela, nós também, consigamos elevar o nosso olhar pro alto e pra frente. E que como ela, nós também aprendamos a permanecer com a Igreja, em Jerusalém, esperando o cumprimento da promessa do Pai. Para que assim, fortalecidos por esse espírito, nós cumpramos a ordem do Senhor, anunciemos o evangelho, preguemos o evangelho, a começar com a nossa própria vida, que é a primeira pregação que o Senhor espera de cada um de nós. Para que assim, o Seu evangelho chegue, de fato, a todas as criaturas.

Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda criatura! (Mc 16,15)

 

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