Se existe uma palavra que resuma todo o tempo da Quaresma e que poderia resumir também a nossa caminhada como cristãos, esta palavra é CONVERSÃO! Nós estamos, na verdade, iniciando esta caminhada, que é, pra todos nós, um tempo de conversão. É Deus que nos concede. novamente, uma chance de melhorarmos de vida, de sermos melhores, de sermos mais convertidos, de sermos mais fiéis a Ele, e assim, não deixarmos passar o tempo da graça, o tempo santo da Quaresma, como ocasião de conversão, para todos nós.
Uma cena do evangelho de S. Marcos (Mc 1,12-15) talvez nos questione, profundamente, porque estamos diante daquele que é nosso Mestre e Senhor, tentado pelo demônio. Parece, de certa maneira, uma contradição… o nosso Mestre, o nosso Senhor, tentado, e tentado pelo demônio? Por isso, a primeira coisa que este evangelho faz conosco é nos consolar, ao reconhecermos que Ele, nosso Mestre e Senhor, passou por esta experiência, e todos nós também passamos, todos nós passaremos e, como Ele, todos nós podemos passar e superar tantas tentações, em nossa vida.
Para que nós, então, vivamos esta proposta de conversão que o Senhor nos faz, é preciso que acolhamos em nossa vida, algumas lições desse evangelho.
A primeira lição que ele nos dá é a de que, como o Espírito de Deus conduziu Jesus, também nos conduz muitas vezes para o deserto. Talvez, humanamente, não escolhessemos o deserto. Não escolheríamos o deserto, não queremos o deserto, nós corremos do deserto. Mas é preciso ser dócil e deixar que o Espírito nos leve a uma experiência de deserto, a uma experiência de parada, de escuta atenta à Palavra de Deus, deixarmos que o deserto também nos prepare para tantos desafios, para tantas missões, como fez com o próprio Senhor.
De certa maneira, nós pensaríamos que o Espírito só nos levaria para planícies, para verdes pastagens, para a beira do mar da Galileia, mas o mesmo Espírito nos conduz ao deserto. É necessário parar e fazer uma experiência do deserto. De certa maneira, o Espírito está, há um ano, nos oferecendo esta experiência de deserto, com esta pandemia. Mas o que estamos fazendo? Correndo o tempo inteiro do deserto. Nós não queremos o deserto, nós fugimos do deserto… nós gostamos do alvoroço, do falatório, da aglomeração, da multidão! E o Espírito nos conduz a esta experiência de silêncio, de parada, de escuta, totalmente oposta à proposta que o mundo nos faz. Na verdade, o Espírito está, há muito tempo nos chamando a esta parada. Nós estamos correndo desta proposta que o Senhor nos faz.
A segunda lição que o mesmo evangelho nos dá é quando relata que Jesus faz uma experiência de deserto, durante 40 dias. Não é um deserto de um dia, não é um deserto de um mês, não é um deserto qualquer, uma crise qualquer, mas é uma experiência demorada, e quando escutamos na escritura a imagem do número 40, é sinal desta plenitude, é o povo que passa pelo deserto 40 anos, é o profeta Elias, que faz também seu retiro de preparação para sua missão, durante 40 dias. E o Senhor, que passa pelo deserto 40 dias.
Na verdade, esta palavra nos ensina também, que os desertos, os desafios da nossa vida não passam no estalar dos dedos, demora… E nós precisamos aprender a ter paciência, nos desertos da vida. Porque nós somos agitados, gostamos das coisas rápidas. Na verdade, nós gostaríamos não das coisas pra ontem, nós gostaríamos das coisas pra anteontem. De tão rápidos que somos, de tão acelerados que somos, não aprendemos a esperar, a reconhecer que as coisas de Deus se dão aos poucos, devagar… até por isso, nós costumamos brincar, dizendo que “obra de igreja demora”! As coisas de Deus demoram, nosso caminho de conversão demora… Há quanto tempo estamos aqui, tentando nos converter. Já estamos? Não estamos. Estamos tentando. Como dizia um padre, amigo nosso, ‘nós vamos morrer, tentando’, porque todo dia é uma nova tentativa, uma nova oportunidade de conversão. E até o dia em que formos colocados dentro de um caixão, nós ainda podemos melhorar, ainda podemos nos converter.
E a terceira lição que o evangelho nos dá é quando Jesus é tentado por Satanás. A imagem do diabo, que de fato nos ronda, nos acompanha, precisa ser entendida por nós não como uma criação da Igreja, não como uma invenção da Idade Média, não como uma imagem pra assustar nossas consciências ou as crianças, mas eu e você cremos na existência do diabo, cremos que ele, como diz S. Pedro em sua carta (1Pd 5,8), está procurando a quem devorar, esperando que nós viremos as costas para Deus, como ele o fez, uma vez por todas.
É preciso que nós cuidemos, para não cairmos em dois opostos: ou não acreditamos no demônio, que parece uma invenção da cabeça de loucos, ou ao contrário, tudo é culpa do demônio. E dessa maneira, o que vamos fazendo? Tiramos a nossa culpa, tiramos a nossa responsabilidade, porque é mais fácil culpar o demônio. Deu problema em casa? É culpa do demônio! Deu problema no trabalho? É coisa do demônio! Onde fica a nossa responsabilidade? Onde ficam nossas escolhas, nossa liberdade? Quantas vezes, meus irmãos, nós não tentamos uns aos outros, quantas vezes, nós não agimos como o demônio, trabalhando pela divisão dentro da nossa casa, dentro da nossa igreja! Há momentos em que nós nem percebemos, e trabalhamos mais para o demônio do que pra Deus, e mesmo nós, cristãos católicos, que estamos na missa todos os domingos, muitas vezes, trabalhamos pela divisão e não pela unidade. E quem divide é ele, o pai da mentira. Por isso, seu nome é diabo, aquele que divide. Quando nós não trabalhamos pela unidade, quando não trabalhamos pela comunhão, não nos esqueçamos, estamos colaborando com a obra de Satanás.
Depois, este mesmo evangelho nos dá outra lição: ao mesmo tempo em que uma criatura de Deus nos tenta, se opõe a nós, outras criaturas estão a nosso favor, como dizia o evangelho, ‘os anjos o serviam’. Exatamente por isso, desde pequenos nós aprendíamos a rezar ao nosso anjo da guarda, que nos guarda, que nos protege, que nos ampara, cumprindo aquilo que Deus havia prometido no Salmo 90, 11ss, que nos enviaria seu anjo, para nos guardar em todos os caminhos, de tal modo que não tropecemos nas estradas da vida. Assim, somos levados a reconhecer que não estamos sozinhos no deserto, não estamos sozinhos no combate, na caminhada da vida. Estamos guardados, amparados por Deus e por seus anjos. Assim temos que, de fato, aprender a ter uma relação com nosso anjo da guarda, aprender a falar com ele, aprender a escutá-lo, aprender a deixá-lo nos guiar no caminho da vida, para que assim, de fato, nos convertamos e sigamos os caminhos que o Senhor nos propõe.
Que assim, meus irmãos, iniciemos este tempo forte, com o empenho sincero e dedicado de nos convertermos, de mudarmos de vida, de nos perguntarmos, com muita sinceridade: o que eu quero mudar na minha vida? Não adianta dizer, “eu preciso tanto mudar isto”! É preciso querer. O que eu quero mudar? O que eu quero transformar, na minha vida? Eu vou me empenhar para quê? ao longo deste tempo quaresmal, para que a graça de Deus não seja desperdiçada, mas ao contrário, produza mais uma verdadeira e profunda conversão da nossa vida.
Que o convite de Jesus encontre acolhida em nossos corações e em nossa vida, para que assim vivamos o tempo de conversão, o tempo da graça, com os olhos fixos no convite que o Senhor nos faz: convertei-vos e crede no evangelho.
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