Ao celebrarmos a solenidade de Cristo, Rei do universo, desponta, imediatamente, diante de nós, a imagem do Cristo, glorioso, sentado no trono, coroado de ouro, com o cetro real na mão. Mas quando escutamos a liturgia da solenidade, e vemos o exemplo do próprio Cristo, percebemos, claramente, que Seu reino não é deste mundo, que Seu reino não se compara com os reinos deste mundo. Que Seu reinado destoa, completamente, de todos os reinados que podemos encontrar neste mundo. E a primeira coisa que a liturgia nos mostra é que o reinado de Jesus, além de não ser deste mundo, tem a tônica do pastoreio.
O profeta Ezequiel nos transmitiu uma palavra de Deus (Ez 34,11-12.15-17), dirigida ao povo de Israel, exilado na Babilônia, sofrendo, sendo perseguido, sendo maltratado, e Deus então, intervém e vai ao encontro desse povo e diz que como pastor, Ele se dará ao Seu povo, Ele apascentará o Seu rebanho, olhará as ovelhas feridas, cuidará das ovelhas mais necessitadas, como o pastor que cuida do seu rebanho. Por isto, nós rezamos, no Salmo 22, “O Senhor é o pastor que me conduz, não me falta coisa alguma”. Mesmo que passemos pelos maiores temores, mesmo que passemos por tempestades violentíssimas, mesmo que passemos por pandemias e guerras, o Senhor é o pastor que nos conduz. Ele me faz caminhar sobre verdes pastagens.
É a certeza que a liturgia dessa solenidade quer gravar em nossos corações e em nossas mentes, que o nosso Deus, o nosso Rei, é um pastor, é um pastor que se faz presente, diariamente, na vida de Seu povo. Não é um líder que aparece de vez em quando, não é um líder que aparece de quatro em quatro anos, não é um líder que entra na comunidade como mercenário. Não! O nosso Deus, o nosso Rei, é um pastor, que se levanta todas as manhãs pra cuidar do seu rebanho. Que vai ao encontro da ovelha perdida, que vai ao encontro da ovelha ferida, porque ama a sua ovelha, porque ama o Seu rebanho, porque ama a tal ponto, que é capaz de dar a Sua vida.
Só por isso, Jesus pode dizer, no evangelho de S. João (Jo 10,14): “Eu sou o bom pastor. O bom pastor conhece as suas ovelhas, o bom pastor dá a vida por suas ovelhas.” É a expressão clara de um amor paterno, de um amor materno, que todos nós experimentamos, a tal ponto que um pai ou uma mãe são capazes de entregar a própria vida por amor de um filho. É esse amor que Deus tem para conosco, é esse amor que a liturgia do dia de Cristo Rei quer nos fazer recordar, pra nos fazer recordar que, na verdade, o reinado de Cristo, do qual todos nós fazemos parte, é um reinado marcado pelo amor. A lei que nos define como membros do reino de Cristo é a lei do amor, como o próprio Jesus nos diz em Mt 22,32-40.
“Amarás ao Senhor teu Deus, de todo o teu coração, com todo o teu entendimento, com toda a tua alma, com todas as tuas forças, e teu próximo como a ti mesmo”. É a marca do reino de Deus, é a marca do reino de Cristo. É o que nos distingue como membros desse reino. Por isso, ao terminar o lava-pés, Jesus se volta para os apóstolos, se volta para cada um de nós, dizendo, “Nisto, todos reconhecerão que vós sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,35).
Exatamente, por isso, o evangelho Mt 25,31-46 narra pra nós, o encontro decisivo entre nós e o Rei, o encontro decisivo entre nós e o pastor da nossa vida, que nos espera pelo amor. O trecho nos faz lembrar de São João da Cruz, que afirmava: “no ocaso da nossa vida, no entardecer da nossa vida, seremos julgados pelo amor”. Não um amor qualquer, não um amor qualquer: “Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei”. É Ele o modelo, é Ele o Rei, é Ele o Mestre, é Ele o Senhor. Por isso, o nosso amor não pode ser abstrato, teórico, mas um amor capaz de dar a vida. Assim nós entendemos o evangelho, quando Jesus diz “Tudo o que fizestes ao menor dos meus irmãos, foi a mim que o fizestes”. E Jesus concretiza esse amor, porque não é um amor meramente poético, não é um amor teórico, não é um amor de cenário, não é um amor que recebemos pelas mensagens nas redes sociais, mas um amor que nos toca profundamente: “Eu tive fome e me destes de comer, eu tive sede e me destes de beber, era estrangeiro e me recebestes em casa, eu estava nu e me vestistes, eu estava doente e cuidastes de mim, eu estava na prisão e fostes me visitar. Todas as vezes que fizestes isso a um dos menores dos meus irmãos, foi a mim que o fizestes.”
E assim, nós esperamos um dia, escutarmos do Senhor estas palavras, que nos introduzirão plenamente no seu reino, reino do qual fazemos parte e experimentamos aqui e agora, e depois dessa vida, viveremos plenamente. Porque um dia, nós ouviremos “Vinde, benditos do meu Pai e tomai posse do reino que meu Pai preparou para vós, desde toda a eternidade”. Eu e você teremos um lugar preparado para nós. O Senhor disse: “Vou preparar para vós um lugar. Na casa do meu Pai tem muitas moradas,” e lá, Deus tem um lugar reservado pra nós.
Podemos abrir mão dele, podemos abrir mão desse reino, porque nesse reino só entra quem quer, ninguém está obrigado, ninguém é coagido a fazer parte desse reino, porque esse reino não é marcado pela coação!
E assim, meus irmãos, nós nos voltamos ao Cristo Rei do Universo, rei de todos os povos, rei de todas as nações, mas tenhamos o cuidado de não projetarmos n’Ele nossos sonhos narcisísticos!
Não esperarmos que Ele seja o rei glorioso, sentado no Seu trono, com o cetro real na mão, como um déspota, e a coroa de ouro sobre Sua cabeça, porque o nosso Mestre e Senhor, porque o nosso Rei está reinando na cruz, coroado de espinhos… Que eu e você permitemos que o Senhor se volte e ao pé do ouvido nos diga: o meu Reino não é deste mundo, como você não é deste mundo! Estamos na terra, mas somos do céu! (Jo 17,14; 18,36)
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