Padre Douglas – A minh’alma tem sede de Vós e Vos deseja, ó Senhor

O que lemos no Salmo 62 é, na verdade, uma declaração de amor que eu e você fazemos a Deus. Somos nós, homens e mulheres que se declaram, que se reconhecem sedentos de Deus, necessitados de Deus. Não de uma forma qualquer, mas profundamente dependentes dEle, necessitados dEle, de tal maneira, como dizia o salmista, nós nos sentimos como uma terra árida, uma terra seca, necessitada de água, necessitada da  fonte que nos renova, que nos fortalece, que é o próprio Senhor. Somos nós que O buscamos, ao longo de toda a nossa vida, e de fato, ao longo de toda nossa vida, permaneceremos sedentos dEle. E nessa vida, nem eu nem você nos saciaremos plenamente do Senhor. Continuaremos insaciáveis, continuaremos insatisfeitos.

Assim, entendemos o porquê de nós, muitas vezes, nos percebermos e percebermos os outros insatisfeitos. Nós somos e seremos, sempre, insatisfeitos, porque só o Senhor nos saciará. Só o Senhor poderá preencher, plenamente, o coração humano. Não adianta querermos preencher o nosso coração com coisas, com pessoas… nunca o nosso coração ficará plenamente preenchido.

Por isso, nós até nos consolamos, porque, de fato, reconhecemos que eu e você não temos capacidade de nos satisfazer. Marido e mulher não são capazes de se satisfazerem, plenamente. A mulher permanecerá sempre insatisfeita, e o homem também permanecerá, porque no nosso coração existe um espaço, um lugar, em que cabe só Deus, só Ele pode preencher este espaço.

Deste modo, nós entendemos porque o salmista chega a dizer que passa o dia desejando o Senhor: “Penso em vós no meu leito, de noite, /nas vigílias suspiro por Vós!” É uma alma sedenta que passa o dia inteiro, do raiar do sol até o sol se pôr, todos os dias, ao longo de todo o dia, nós estamos buscando o Senhor da nossa vida. E por isso, o salmista vivia na esperança de que um dia vamos experimentar a saciedade na casa do Senhor, vamos ao Seu encontro, buscamos este Senhor que preenche o nosso coração.

Podemos então, entender porque Santo Agostinho dizia que o nosso coração está inquieto, enquanto não repousa em Deus.

No Livro da Sabedoria (Sb, 6) encontramos algo curioso. Na verdade, não somos nós que vamos ao encontro do Senhor, é Ele que vem ao nosso encontro. O Livro narra pra nós, personificando a sabedoria como a imagem do próprio Deus, como a imagem do próprio Senhor Jesus. Por isso, Paulo (1Cor 1,24) vai dizer, “Cristo é a sabedoria de Deus”. A sabedoria vem ao nosso encontro.

Vejam a imagem que o autor sagrado usava: “Quem por ela madruga não se cansará, pois a encontrará sentada a sua porta (…) Pois ela mesma sai à procura dos que a merecem…” É o Senhor que vem ao nosso encontro, nós, às vezes, pensamos que estamos correndo ao encontro do Senhor, mas Ele já nos encontrou, Ele tomou a iniciativa, Ele tomou a dianteira. Por isso, Paulo (Fl 3,12) chega a dizer, “corro ao encontro daquele que me encontrou”. Nós, na verdade, estamos correspondendo a um amor que Deus tem primeiro para conosco. Nós estamos respondendo a um amor que experimentamos.

Assim, entendemos a parábola das dez jovens (Mt 25,1-13) que, na verdade, formam a imagem da humanidade inteira, que corre ao encontro do seu Senhor, corre ao encontro do seu Deus, e deseja entrar para as núpcias eternas, entrar para a celebração na qual nós seremos satisfeitos. Mas como essas jovens, nós precisamos também caminhar com nossas lâmpadas acesas, lâmpadas acesas pela nossa vida, pelas boas obras que fazemos.

De certa maneira, parece que a parábola nos remete para o nosso Batismo, quando, naquele dia santo, nós recebemos a chama da fé; naquele dia também, o Senhor acendeu em nossos corações a luz da fé. Chama esta, que num primeiro momento nossos pais e padrinhos tentaram conservar e alimentar. Depois, eu e você nos tornamos responsáveis por ela, responsáveis por manter a chama acesa, e reacendê-la sempre, alimentá-la sempre, reavivá-la sempre. Curiosamente, precisamos entender que não cabe aos outros alimentar a chama da nossa fé. Não cabe aos outros dar o óleo que é nosso, cada um tem a sua missão, cada um tem o seu dever, e por isso, somos convidados a não culpar os outros, porque a nossa chama está apagada, porque a responsabilidade é minha, é sua. Não culpemos os outros, quando a nossa chama se apaga. Quem faz essa chama ficar acesa, sou eu, é você, pela graça de Deus.

Assim, somos convidados a vivenciar profundamente, essa experiência de permanecer vigilantes, previdentes, preparados, para que quando o Senhor nos encontrar, diga a todos nós, o que Ele depois repetirá no capítulo 25 de S. Mateus: “Vinde, benditos de meu Pai e tomai posse do reino que o Pai preparou para vós, desde toda a eternidade.” E assim entraremos para as núpcias eternas, porque o Senhor que nos ama, é o Senhor que nos quer junto dEle.

Mas é preciso que estejamos preparados para entrar na Sua casa. Por isso, Jesus, no evangelho, diz que as imprevidentes gritam e pedem ao noivo que abra a porta para que elas possam entrar. E o noivo dá uma palavra dura, “não vos conheço”! Parece que este noivo nos coloca diante de Mt 7,21, quando Jesus diz: “Nem todo aquele que me diz Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus, mas somente aquele que coloca em prática, a vontade do Pai que está no céu”.

Assim, um dia, nós desejamos experimentar o que Paulo nos anuncia em 1Ts 4,13-18, lembrando-nos que todos aqueles que entraram no sono da morte, e que estão dormindo, é porque um dia acordarão. Como eles, também nós, desejamos permanecer unidos a Cristo, para que com Ele, ressuscitemos, com Ele e para Ele. E assim Paulo dizia, “estaremos com o Senhor, para sempre.

O Senhor estará para sempre, conosco, o mesmo Senhor que nos encontrou, o mesmo Senhor que nós buscamos. Que o Espírito de Deus venha reacender em nossos corações a chama da fé. Reacender, em nossos corações o desejo de buscarmos, enquanto vivermos, o Senhor da nossa vida, e reconhecermos que nosso coração permanecerá a vida inteira inquieto, enquanto não repousa em Deus. Porque, de fato, minha alma, sua alma, têm sede do Senhor.

Minha alma tem sede de Vós e Vos deseja, ó Senhor!