No século XVII, numa Londres assolada por pragas e pestes, sequer havia medicamentos. Antibiótico, nem em sonho! Foi quando o poeta inglês John Donne escreveu que “Nenhum homem é uma ilha”. Nessa mesma época, com os teatros fechados, Shakespeare, em quarentena, escrevia poemas e peças.
Nenhum homem é uma ilha. A pandemia não é um problema dos outros, é nosso. Precisamos escolher e toda escolha tem seu preço. Existem contratos e valores a serem defendidos, sem os quais a sociedade desmonta, como um castelo de cartas.
Como durante a Segunda Grande Guerra, depois da qual, diante do desafio de sobreviver, a sociedade priorizou a ideia de colocar a proteção do ser humano no vértice de todos os valores a serem considerados.
Hoje, na pandemia, quando assistimos nossa esplêndida fragilidade derretendo como gelo na calçada, amparar valores fundamentais como a vida, a solidariedade e o cuidado ao próximo são o resultado positivo de um momento ameaçador.
Em situações de grandes perdas, não há vencedores. Mas há aprendizado. Só será possível compreender esse momento com transparência. Nada dessa experiência cruel será perdido se for possível aprimorar um espírito solidário de compaixão numa opção prioritária de proteger a vida.
De tudo, sempre emerge algo positivo. É do barro que brota a alvura do Copo-de-leite. A Peste Negra que dizimou a Europa no século XIV, também antecipou o final da prolongada Idade Média e permitiu o florescimento do Renascimento.
Não sabemos o que essa pandemia trará de avanços. Por enquanto, já sabemos que ela está sendo uma espécie de laxante de um sistema que, antes dela, insistia em continuar com suas mazelas todas.
Tomara que ela seja, também, um apaziguador social, um jeito novo de conviver, além das diferenças e das desigualdades.
+Dom José Francisco Rezende Dias
Arcebispo Metropolitano de Niterói